TEOLOGIA ESCAPISTA
Particularmente,
por anos, estive condicionado a um tipo de “profetismo escatológico
catastrófico”, comum à quase totalidade da cristandade do seguimento pentecostal,
de uma “fuga do inferno na terra”. De fato, considerando sua sistemática e elaborada
organização, a escatologia pré-milenista deteve a preeminência entre a maioria
dos cristãos ao redor do mundo, com suas teses sistematicamente difundidas pelo controverso teólogo C.I. Scofield e sua Bíblia de Estudos. Ao tornar-me cônscio da
necessidade de uma compreensão escatológica não condicionada ao seguimento
denominacional, pude, com iluminação e coerência, estudar à cerca deste tema;
confesso que por alguns momentos me senti à beira da “heresia”, dada a grande
diferença entre a crença denominacional que sustentei por anos, e a verdade.
Acerca
disso, ainda me pronunciarei pormenorizadamente, mas para esta postagem,
entendi que seria interessante apresentar pensamentos lúcidos de um teólogo
conservador e bíblico. As palavras do respeitado pastor e teólogo
norte-americano Phillip G. Kayser, representam maravilhosamente bem a teologia
(em especial a escatologia) da Igreja
em seus primeiros mil e oitocentos anos (até
1840 d. C.) que refuta com sólido fundamento escriturístico a perspectiva
de Deus acerca do envolvimento da Igreja nos “assuntos da Terra”.
Enéas Ribeiro
O pecado
do escapismo é uma realidade, e mesmo os melhores dos santos têm sido tentados
neste pecado. No Salmo 11, Davi foi tentado a fugir como um pássaro para uma
montanha, pois os fundamentos da sua cultura estavam sendo destruídos. De fato,
naquele capítulo ele está descrevendo vários problemas que estamos
experimentando atualmente na América. Mas ele resistiu à tentação de escapar, e
resistiu pela fé. Ele recusou escapar das suas responsabilidades.
Uma forma
de escapismo é encontrada na declaração “nossa cidadania está no céu e devemos
tirar as pessoas da terra”. Mas Paulo não encontrou nenhuma contradição em
reivindicar uma cidadania celestial em Filipenses 3.20 e ao mesmo tempo
reivindicar e usar sua cidadania romana em Atos 16.37-39 e em 22.22-29. Nossa
cidadania celestial (se corretamente entendida) impactará profundamente nossa
cidadania terrena. Ela traz em perspectiva aquela frase maravilhosa, “Uma nação
sob Deus”.
Outra forma de escapismo pode ser encontrada na
declaração, “O reino de Deus não é deste mundo”. Novamente, essa é uma
declaração verdadeira se enterdemos pela palavra “de” [deste = de +
este] que o reino de Deus não é derivado deste mundo. Ele é
derivado do céu. Mas o que a oração do Senhor pede? “Venha o teu
reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.”
Essa não é uma oração escapista. É uma oração que deseja ver o reino celestial
influenciar e mudar as coisas terrenas.
Outra forma de escapismo pode ser encontrada na
expressão, “Estamos buscando apenas aquelas coisas que são de cima”. Uma vez
mais, essa é uma declaração verdadeira, mas retirada do contexto. O contexto de
Colossenses 3 é que Cristo (que é de cima) é suficiente para tudo o que
precisamos na vida. Não se trata de um chamado para escapar da vida. E sabemos
isso porque Paulo continua e mostra em Colossenses como Cristo é suficiente
para as nossas relações no casamento, com os filhos, patrões, empregados e
“tudo quanto fizerdes”. Isso não é escapismo. Isso é pedir que a Sua vontade
seja feita na terra como é feita no céu. Mas era um mundo terra firma que
estava sendo afetado em Colossenses.
Outra
escusa dada é que o mundo não é importante. J Vernon McGee disse certa feita:
“Você não dá uma polida no casco do navio que está afundando”. A ideia é que
quando um navio está afundando, não se preocupe com o navio – salve almas! Ele
acreditava que o nosso mundo estava afundando, sendo o evangelismo a única coisa
importante com a qual deveríamos nos envolver. Mas João o Batista estava
polindo casco quando tentou produzir reforma política em Lucas 3.19? Não! Ele
estava fazendo o que todos os profetas do Antigo Testamento fizeram –
confrontando males na sociedade e tentando fazer a diferença. Louvo a Deus por
ele estar levantando candidatos que estão tentando produzir reforma em
Washington, DC. E você verá, sem dúvidas, vários deles chegando através dessas
portas. Se o mundo não fosse importante, por que o Novo Testamento diz que Deus
estava em Cristo reconciliando o mundo consigo mesmo (2Co 5.19)? Por que ele
prometeria que os mansos herdariam a terra (Mt 5.5)? Por que Jesus recebeu toda
a autoridade no céu e na terra no primeiro século? Por que Romanos 13 diz que o
magistrado civil é servo de Deus, um ministro de justiça? Por que o Novo
Testamento diz tanto sobre empregadores, empregados, economia e administração
da terra? Obviamente o mundo é muito importante para Deus. A Bíblia diz,
“Porque meu é todo animal da selva, e o gado sobre milhares de montanhas”,
demonstrando de maneira óbvia que ele está interessado em gados e montanhas. Eu
amo o hino cristão “Alegria para o Mundo”. Ele diz que a graça de Deus é
destinada a avançar, indo até mesmo onde a maldição é encontrada. Isso é bem
longe. A maldição tem impactado negativamente a política? Sim, tem, e a graça
de Deus é suficiente para ir bem longe, mesmo onde a maldição é encontrada.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto – janeiro/2012
Phillip
G. Kayser é o pastor sênior da Dominion Covenant Church em Omaha, Nebrasca.
Recebeu o seu M.Div. do Westminster Theological Seminary (Califórnia) e o seu
Ph.D. do Whitefield Theological Seminary (Flórida). Ele e sua esposa Kathy têm
5 filhos.